A
ministra da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial (Seppir), Luiza Helena de Bairros, disse nesta segunda (5), em
audiência pública no Senado, que a falta de interação entre o governo
federal e os institutos de terras dos estados é o principal entrave para
a regularização fundiária das terras remanescentes de quilombos,
prevista pela Constituição Federal de 1988 e que avança há passos ainda
mais tímidos do que as das comunidades indígenas.
"Há
quilombos em terras devolutas dos estados, que não são contestadas por
outras partes. Nós não temos desculpas para que a titulação não aconteça
em uma velocidade maior", afirmou.
De
acordo com a ministra, o Brasil possui, hoje, cerca de 1,17 milhão de
quilombolas, boa parte deles vivendo no limite da miserabilidade. Ela
informou também que há hoje no país 1.948 áreas reconhecidas como terras
remanescentes, além de outras 1.834 já certificadas pela Fundação
Palmares, órgão ligado ao Ministério da Cultura. São exatos 1.167
processos abertos para titulação de terras. Entretanto, apenas 193 áreas
foram, de fato, tituladas. "Nossa prioridade, agora, é dar ao Programa
Brasil Quilombola a dimensão estadual que ele sempre deveria ter tido.
Precisamos pensar as políticas públicas em todas as suas dimensões",
observou.
Luiza
Helena de Bairros informou que o Brasil Quilombola, criado há oito anos
pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estrutura as políticas
públicas destinadas aos quilombolas em quatro eixos: acesso à terra;
infraestrutura e qualidade de vida; inclusão produtiva e desenvolvimento
local; e direitos e cidadania. "Por mais que melhoremos as políticas
sociais, a avaliação do governo por parte das comunidades não passa por
isso. Passa pela nossa capacidade de dar conta dos problemas fundiários.
Do ponto de vista das comunidades, é a questão central. Portanto, além
de ampliar cobertura das políticas sociais, temos que fazer com que a
regularização fundiária tenha avanços mais significativos", acrescentou.
Professora
da Faculdade de Ciências Sociais, Política e História da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), Lilian Cristina Bernardo Gomes destacou a
importância do país conter o etnocídio a que o povo negro brasileiro
vem sendo submetido historicamente. "A democracia brasileira só se
aprofundará na medida em que ela for capaz de refletir o que se passa na
sociedade", afirmou.
Segundo
ela, a demanda principal das comunidades quilombolas é a terra, porque a
noção de identidade dessas comunidades está diretamente ligada ao
território em que vivem. Entretanto, apesar da Constituição Federal
reconhecer este direito e aclamar a cultura remanescente como patrimônio
nacional, são inúmeras as artimanhas utilizadas para restringir os
direitos desta população. "De onze projetos de lei já apresentados na
Câmara sobre o tema, sete são restritivos ao direito quilombola",
afirmou.
Como
exemplos, citou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, que
transfere do governo para o Congresso a responsabilidade pela demarcação
de terras indígenas e quilombolas, e o Projeto de Lei 1.836/2011, que
descaracteriza o caráter coletivo da propriedade das terras quilombolas.
A pesquisadora criticou a supressão, pela Câmara, de um trecho do
Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) que reafirmava o direito
definitivo à propriedade das terras e esclarecia que o benefício é
coletivo.
Para
Lílian Cristina, se não tivesse sido suprimido da lei, o trecho
asseguraria direitos aos quilombolas que hoje são contestados no Supremo
Tribunal Federal (STF), em especial a ação apresentada pelo DEM
questionando a inconstitucionalidade do Decreto 4.887/2003, que
regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos. A cientista social avalia
que estruturas políticas caducas reverberam o lugar comum de que, no
Brasil, o branco é o detentor natural da posse da terra.
(Postagem do Blog G.E.R.A)